No final dos 60, as entorses e os problemas musculares não tinham tratamentos sofisticados e orientalizados.
As pessoas iam ao endireita, personagem meio bruxa, meio sábio que curava as mazelas com movimentos calculados e precisos que doíam à brava mas resultavam.
Deitávamo-nos numa marquesa, após horas de espera na sala abafada da sua casa particular e aguardávamos que as suas mãos santas palpassem o problema.
Identificada a mazela, o endireita assumia o seu ar proficiente, recuava para uma divisão remota da casa de onde trazia ungüentos (assim mesmo com esta grafia) que colocava próximo da nossa dor. Depois, num gesto súbito e irredutível, torcia, puxava ou contraía, conforme o caso, e o musculo ou osso voltavam ao seu lugar habitual, abandonando o seu percurso transviado.
Era o momento da dor, aguda e intensa, em que imaginávamos o fim do mundo que nos prometiam na Igreja.
O suor frio e o enjoo tomavam conta de nós pelos segundos seguintes que representavam as horas de dor. Ponderávamos se não valia a pena ter ficado com a maleita e jurávamos em contrição nunca mais lá voltar, sonhando com o analgésico do médico ou dos enfermeiros reunidos.
O facto é que poucos minutos depois, com a dor extinta e o ânimo recuperado, regressávamos ao prazer de nunca ter estado doentes.
Também havia as rezas para completar os tratamentos. A minha avó trazia uma vez por mês uma senhora que nos rezava por mais de uma hora com um ramos de arruda.
Geralmente era aos Sábados de manhã e ficávamos lá, ensonados durante uma hora (pelo menos era o tempo que eu imaginava durar!) entre credos e ave-marias repetidas naquele ritmo anestésico, tão próprio da oração.
Ao que parece, garantia-nos protecção contra o demónio, saúde e felicidade o que me parece suficiente para uma existência agradável. Gostava do cheiro da arruda que tocava os flancos de forma adocicada. E da preocupação daquelas pessoas velhas com a minha existência, como se o seu papel no mundo fosse o desvelo com quem ainda tem de cumprir um caminho.
Tudo isto para explicar que estas duas almas que cá escrevem não estão disponíveis para dizer o que seja sobre este embróglio entre ricos, políticos, corporações, jornalistas e presidencialistas. A imprensa, transformada que está em cort de ténis destes torneios de pares não merece sequer uma linha.
Isto porque o que se passa não é um problema de escutas, de liberdade de imprensa, de privacidade, de manipulação, corrupção e brega pulhice! É um problema de Regime, é de todos sem exclusão. É da forma irresponsável como todos os agentes tem conduzido a sua vida pública, como todos os profissionais tem deixado de o ser, como a indignidade, a indiferença e os Judas do país se tem deixado subornar.
As corporações que sentiram a luva de Sócrates retirar-lhes beneplácitos e agora preparam a cama onde o próprio se deitou, agem da forma mais canalha possível, dinamitando a República! Melhor seria sofrer um ataque terrorista porque este é físico e não moral! Os políticos dos vários quadrantes, por não terem percebido que, mais do que o Poder é o sentido de Estado, o país e o povo que conta e não os seus sacrossantos interesses pessoais. E finalmente o néscio gang de capitalistas portugueses que não descansam enquanto não fizerem o 24 de Abril.
A todos muito obrigado por insultarem o país e, por favor, sigam o conselho de Ricardo Salgado e fujam porque cérebro como os vossos nos faz apreciar o analfabetismo.
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