Pular para o conteúdo principal

Elogio a Burguesia

O país só progride com ricos (...) é bom que existam, é bom que dêem muitas festas, que comprem muitas coisas, porque isso dá postos de trabalho a dezenas de pessoas"

Manuela Ferreira Leite, ex-ministra das Finanças e da Educação, candidata do PSD, Diário Económico, 30/7/2009

A burguesia é um bem. Devemos-lhe muito. Devemos o amor às artes e a cultura, evoluções determinantes no domínio científico, no património urbano, algumas das liberdades e garantias relevantes, o combate à Monarquia, enfim, um sem número de benefícios.
Nem tudo são rosas, claro está.
Da Burguesia emerge o Capitalismo, a coisificação humana, a exploração absurda dos recursos naturais, a criação do excedente, o financiamento criminoso de homicídios, de governantes fantoches, etc., etc., etc.

Nada tenho contra a riqueza produtiva. Acho que uma pessoa empreendedora, capaz de avançar, arriscar e movimentar a sociedade é útil e necessária. Alguém que enriquece por via do seu temperamento e esforço pode rodear-se de conforto e – porque não – de algum luxo se no seu ponto de vista isso redunda numa felicidade pessoal.

Todavia, esse mesmo “burguês” deve acompanhar o seu progresso económico de uma consciência objectiva em vários planos a: nível social, porque a riqueza acumulada se não tiver uma justa distribuição acaba por resultar em conflito, o que enfraquece a sua própria riqueza; a nível ético porque a acumulação que gera pobreza, esgotamento de recursos naturais, poluição representa a falência da humanidade e do próprio sentido do enriquecimento e finalmente ao nível do desenvolvimento humano porque não faz sentido acumular por acumular: a partilha permite o progresso conjunto de todos e ao progredirmos solidariamente encontramos um significado para existirmos e fruirmos as coisas que são de facto importantes.

O boçal argumento sobre os improdutivos que vivem à custa da sociedade é um discurso agastado de uma franja da sociedade saudosa de um povo com humildade salazarista, de quem sente falta de “uma mão firme” que “tome conta disso”. São gente que a vida frustrou, que não “subiu na vida” como desejava, que interpretam o trabalho pela sua própria participação social, isto é, “está tudo mal porque ninguém me ouve”.
O agastamento de uma certa classe média que nunca o será verdadeiramente e que se sente aviltada no seu direito de ser mais qualquer coisa do que de facto é tornou-se o verdadeiro cluster dos fabricadores de opinião que povoam os telejornais. O discurso dos media é para este grupo de insatisfeitos que de facto conta muito pouco para o país (a excepção do PSD, naturalmente).

Ter riqueza e ter ética é possível, não é contraditório desde que se saiba que para atingi-la precisaremos sempre de outros seres quer para produzir, quer para consumir e que se não os tratamos bem, esses outros rebelam-se, desinteressam-se ou internam-se numa anomia de que resulta sempre o pior.

MFL infelizmente é do tempo em que a família “de bem” possuía um nome e que isso abria todas as portas, como se de um direito divino se tratasse.
O seu discurso não é para o povo, não é para a classe média e – pasme-se – nem para esta burguesia produtiva.
É um discurso para os improdutivos deste mundo. Para aquela classe de financeiros de que o seu partido é pródigo e que vemos a entrar nos Tribunais ultimamente (sem algemas para não amarrotar o Prada e a provar que até na prisão o pobre vai algemado e o rico, escoltado); é o discurso para aquela pobre gente tonta que tanto interessa o povo por este não conseguir perceber que com eles partilham uma não-vida.
Ambos são miragens, existem numa alarmante necessidade de protagonismo, de imagem de fantasia para ocultarem o seu vazio.
E a imagem que me persegue é imaginar MFL num diáfano vestido de chiffon azul, ao entardecer numa varanda voltada para o imenso mar, entre sorrisos e acenos a retirar um flute de champanhe rosé da bandeja de prata do empregado negro vestido de branco com luvas a discutir o matinal passeio de iate.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Alguém nos explica isto?

Os registos de voo obtidos por Ana Gomes em 2006 revelam que, entre 2002-2006, em pelo menos 94 ocasiões, aviões cruzaram o espaço aéreo português a caminho de ou provenientes da Baía Guantanamo . Em pelo menos 6 ocasiões aviões voaram directamente das Lajes nos Açores para Guantanamo. Ver o relatório da ONG britânica. Não creio que isto nos deixe mais seguros e tenho a certeza de que me deixa a consciência pesada, foi o estado em que me integro que permitiu isto. PS (por sugestão do Vinhas). As notícias sobre um dos aviões que transportaram presos para Guantánamo e que agora se despenhou no México carregado de cocaína podem ser vistas aqui e aqui ou ainda aqui.

Dez pontos de vista sobre as eleições americanas

Este texto surge em versão bilingue porque, por alguma razão inexplicável, grande parte das pessoas que acede a este site são provenientes dos Estados Unidos. Obviamente sabem português senão não nos visitavam. A opção de dobra-lo em inglês é permitir que se criem extensões possíveis a outros bloggers americanos. This text is published in a bilingual version because, for some reason I can't explain, most of the blog visitors come from USA. Obviously they know Portuguese or they wouldn't visit our blog. But the option to double it in English is to allow other American bloggers to read it. My apologies for this vain effort of translation. 1- Não sendo a democracia Americana uma verdadeira democracia (uma vez que o voto popular não é directo e as campanhas num país de dimensão continental envolvem verbas que não permitem a qualquer cidadão concorrer) nem a provável vitoria dos Democratas mudará este sistema perverso. American democracy is not a true democracy (as soon as the p...