Segundo os sábios educadores de Nampula, Moçambique, "É preciso toda a aldeia para educar uma criança". De facto a socialização exige uma integração saudável na comunidade que, começa mas não se limita à família. E é interessante reflectir sobre isto numa altura em que em que se vive uma alteração do conceito de família, cada vez mais baseada na família nuclear, na família dividida e monoparental acrescentando-se que a legislação já reconhece outras famílias.
Curiosamente, ou não, a verdade é que em relação ao assunto família o modelo par, pai e mãe, ainda não foi ultrapassado. Assim mesmo que sejam do mesmo sexo insiste-se neste modelo mesmo quando não apoiado pela biologia e recusando modelos mais alargados. Não vejo porque tenha de ser assim, na verdade, uma coisa é de momento certa, para gerar um ser novo é preciso masculino e feminino, ponto. Se esses não são um casal, pois a biologia pouco se importa com o caso. Então porque não alargar mais a família, porquê um casal e não dois? Sempre não obrigaria ao compromisso estranho de contribuir para que outros tenham um filho e esquecer o assunto por aí - isto levanta algumas questões, se por um lado o compromisso, com o tempo, pode parecer disparatado, por outro isto veda à criança a possibilidade de conviver ou mesmo de saber quem é um dos progenitores.
E esta incapacidade de ultrapassar o modelo pai/mãe acaba por gerar uma panóplia de simulações do modelo, cuja capacidade de criar problemas me parece notória apesar de se achar que uma educação adequada evitará quaisquer questões a esse respeito. As situações de facto criadas têm ainda a agravante da impreparação do sistema judicial para lidar com estes casos, ou seja, em caso de conflito a criança ficará, no limite, limitada a um dos intervenientes da ex-família sendo-lhe porventura vedado o contacto com alguém com que tem laços emocionais e possibilitando uma série de novos problemas psicológicos que seguramente acabarão por levar à crise da instituição família encarada desta forma.
Na verdade talvez sejam estes os passos sociologicamente necessários para a evolução da instituição, mas é pena, pena porque não vejo a necessidade de tanto sofrimento para se chegar a uma outra solução.
Talvez por ter formação jurídica, neste campo tenho visto de tudo e torna-se cansativo. A curiosa 'produção independente' baseada na opção de não querer um parceiro(a) nem querer estar sozinha(o) - chegando até a encarar o nascituro (bonito termo técnico-jurídico para designar quem nascer) como uma espécie de segurança na velhice... Ninguém merece ser alvo de amor tão interessado e cabal nos projectos de futuro. É extraordinário como projectos destes esquecem que o tal nascituro depois de nascer passa a ser um sujeito de liberdade, e por mais 'educado' que seja um dia vai pensar pela sua cabeça, colocar as suas questões e decidir em conformidade. E ainda bem.
Deparei até com o caso mais clássico de quem adoptou a filha da namorada, para depois seguir a sua vida, ter outros filhos e ocorrer-lhe que, depois de toda a gente adulta, e por questões de sucessão nos bens, que poderia revogar a adopção - ora felizmente, esta é irrevogável, já sabia o legislador que a volubilidade humana não tem limites nem fronteiras.
Reconheço que, mesmo sabendo que estes conflitos resultam mais de volubilidade e hedonismo do que de maldade, a sua normalidade e capacidade de surgirem onde não se espera, aborrecem-me de tal forma que me afastei da minha área de formação. Até porque me invade sempre a dúvida de saber se, para finalizar a primeira década do século XXI, não seremos capazes de melhor?
Nota: onde se lê nascituro, deve ler-se concepturo uma vez que se refere não apenas a fetos já concebidos (nascituros) mas aos ainda não concebidos. Peço desculpa pelo erro.
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