No entanto o argumento sobre o qual é construída a sua importância tem algo de falacioso, uma vez que obedece a uma lógica construída em vectores que se comprovam, dia após dia, serem errados.
A valorização destes países tem a ver com o crescimento demonstrado na última década, potencial económico e dimensão dos recursos.
Todavia é uma precipitação arvorar a sua importância exclusivamente nestes critérios.
O mais relevante nos BRIC é a sua saída da dependência tecnológica e intelectual e a descoberta de que não necessitam das “antigas potências” (correndo o risco de datar a influência dos Estados Unidos e Europa que ainda perdura em alguns domínios mas que vai esmorecendo e apenas se mantém – no caso americano – enquanto ameaça bélica).
A isto soma-se uma visão pragmática do momento o que lhes faz saltar sobre inúmeras condicionantes políticas, aproveitando o momento e o lugar para a cada passo conquistar um espaço de afirmação.
Os BRIC são muito desiguais na forma e conteúdo, história e filosofia, crenças e expectativas para podermos dizer que podem caminhar por uma estada comum sem esta lucidez de afirmação positiva.
O que os une tem a ver com três aspectos fundamentais:
- A relevância económica;
- A crescente influencia política internacional;
- A oposição a uma lógica euro-americana para o mundo.
De todas estas, a que mais interessa é a última (que só foi possível alcançar pela existência das outras mas que, espero, não se torne a decisiva).
A “revolução antropológica” da política internacional passa actualmente pela compreensão mais lata do que representa a soberania e a autodeterminação dos povos, espaço onde os BRIC conquistaram um espaço diplomático óbvio porque tiveram de lidar (de formas diferentes, é certo) com esta dimensão.
Não me espanta o sucesso (ainda que por comprovar) de Lula no Irão. Os Estados Unidos viram sempre o Irão como os “maus”, esquecendo que a preocupação dos países árabes é Israel (que possui armas nucleares mesmo que não assumindo). Não percebeu a questão central do equilíbrio regional por ter o Irão como inimigo.
Lula não tinha nada a perder neste terreno. Mesmo que não conseguisse qualquer acordo, abriria as portas para outros entendimentos.
Aproveitando a diplomacia dupla face da Rússia, avançou com a Turquia (outra letra que mais cedo ou mais tarde se juntará ao BRIC) para um entendimento útil a todos: permite ao Irão “cozinhar” o seu projecto nuclear, resolve a questão do abastecimento tecnológico via parcerias com Brasil e recebe por troca urânio para os seus projectos não bélicos, sem preocupação com a reciclagem e armazenamento.
Excelente negócio.
O Brasil ganha pontos internacionalmente e mais uma parceria comercial de grande relevância numa zona até agora por explorar; a Rússia abençoa e aproxima-se da Turquia, numa estratégia de expansão da sua área de influência num país chave entre a Europa e o mundo árabe e o Irão escapa a constante recriminação das Nações Unidas e esvazia o discurso americano.
A Europa, neste momento conta os trocos.
O que mudou foi a linguagem. Na aproximação, o Brasil respeitou o Irão, reconheceu o seu legítimo direito à defesa mas, acima de tudo, fez entender que o Irão não está só. E isso é mais relevante que todo o resto.
Se o Irão tiver juízo, entrega-se nos braços deste acordo e até autoriza inspecções das “nações amigas”.
Assim agem as BRIC. A China, quando quiser, dobrará a Coreia do Norte (geo estrategicamente não o quer fazer já) e apesar da sua excêntrica leitura dos Direitos Humanos, sabe o caminho que irá trilhar.
A Rússia quando resolver os separatismos envolventes e o crime organizado, fará o seu caminho dual entre a Europa e a Ásia, tentando ser relevante nos dois lados.
A Índia será dentro de um par de décadas a grande nação tecnológica mas sem a relevância dos primeiros devido a profunda estratificação social que a lógica da tradição impõe.
Agora, é o tempo do Brasil.
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