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As Reflexões da Sedes 2

Abordando outro dos factores levantados pela Tomada de posição da Seres, temos a relação entre justiça e comunicação social e a qualificação da relação entre o ineficaz e o sensacionalista, respectivamente.
Sem querer defender a imprensa que obviamente tem culpas no cartório em relação à situação vivida, penso que a suspeição sobre a classe política não foi criada por ela: foi a própria classe política que deu as bases para a sua suspeição, numa sucessão de processos e casos de tal envergadura e dimensão que é impossível escapar-lhes. A imprensa apenas aproveitou o filão.
O que é demoníaco no papel da imprensa foram as manobras para “contornar” o segredo de justiça e a inviabilização de linhas de investigação propiciadas por fugas ora promovidas pelos envolvidos, ora utilizando meios à revelia de toda a deontologia profissional. Quando não obtinham os dados necessários, entraram num frenesim de insinuações e análises desprovidas de fundamento que arrastaram até os profissionais envolvidos para saciar este desporto nacional que é a coscuvilhice. Quando isto não chega, ataca-se o sistema naquilo que, de facto, este apresenta de problemático: a morosidade, os tempos de investigação, as limitações da aplicação legal (que chegam até o ponto da inversão do ónus de prova!) e a intocabilidade da classe política por força do sistema legal que os protege enquanto governantes.
Mas a imprensa fá-lo porque? Porque há uma “angry mob” de cidadãos ávidos de justiça popular, porque há uma agenda política a cumprir e a acção da comunicação social age de uma forma não isenta porque pertencem a grupos de interesse específicos, porque a concorrência entre os media é feroz e os estagiários que compõem as redacções sabem que o seu lugar depende de dizer sim à revelia do que se aprendeu (no curso, em casa e com os seus avós).
Todo este “caldo” donde provém? Quando começou a desenvolver-se e porque?
Quanto a mim, a resposta está no cavaquismo. Faltam estudos sociológicos sérios que permitam avaliar o impacto do único período de governação portuguesa onde existia dinheiro europeu às catadupas (FSE, Agricultura, FEDER, etc.) onde se podiam satisfazer exigências de consumo à classe média, onde passamos a ter um preço, acarinhados pelo sonho de ser um país europeu na plenitude.
A classe média emergente e um volumoso grupo de recém-licenciados encontra colocação e investe afincadamente na sua modernização com o empenho do seu trabalho. Concomitantemente, a classe política vê-se com recursos extraordinários e com o assédio de empresas e empresários a que não resiste. Portugal moderniza-se na fachada, mas o povo marca passo no plano social. Não há valorização, combate à pobreza, revolução educativa. Há ajustamentos e um crescente volume de gastos para empregar gente e mais gente para “tapar” os problemas.
Subitamente, acordamos do sonho e damos conta que o país tem mais betão, mais alcatrão, mais pontes, aeroportos, prédios giros, etc. mas o povo, está na mesma: os pobres são os mesmos, as necessidades, as mesmas. Colocaram o outdoor da qualidade à frente dos pratos vazios, dos idosos, dos excluídos. E são muitos.
Perante o desespero do diminuir dos recursos e a desilusão, iniciou-se um processo de “salve-se quem puder”, que gerou as cumplicidades, as mas intenções e os aproveitamentos que alicerçam as actuais suspeições.

Perdemo-nos no caminho? Sim, todos nós. Para voltarmos a ser portugueses temos de olhar para trás e ver os ensinamentos, utopias e crenças que abdicamos, enfim, aquilo que os nossos pais e avós nos ensinaram com o 25 de Abril.

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