Fidel é como a Água Tónica: ou gosta-se ou odeia-se. Não há cá meios termos.
No entanto, quando a agitação emocional repousar relativamente à sua figura, poder-se-á, enfim, construir uma visão mais racional sobre um homem que configurou uma nação.
Não tenho uma visão romântica de Cuba.
Nunca lá fui de férias, apesar de ser um destino muito apreciado pelos portugueses. Dos que regressaram, ouvi várias histórias que vão desde o idílio apaixonado por um país “romântico”, como um referencial nos idos de 60 até a falta de condições, degradação habitacional, etc.
O povo cubano é retratado simpático mas não servil, educado mas não condicionado.
O único ponto comum aos diferentes relatos que ouvi converge num aspecto: as dificuldades quotidianas e a falta de bens materiais de primeira necessidade.
Conforme as formatações políticas dos meus amigos que visitaram a ilha surgem indícios de corrupção, existindo lojas para o povo e outras para estrangeiros e para as personagens do “aparelho”, as encenações turísticas de rumba até a madrugada, as praias em degradação por uma exploração turística que já vai para além da capacidade de acolhimento e regeneração ecológica.
Outros apregoam que as necessidades e precariedades são fruto do histórico embargo e que a falta de recursos e meios de desenvolvimento da nação passam pelo errado comportamento americano que sufoca o que não domina.
Ouço-os todos e Fidel está no centro, como um farol no que há de pior e melhor.
Longe destas diatribes de santificação/diabolização de um homem convém esclarecer que, apesar das minhas convicções de esquerda, não posso renegar que a Democracia e os Direitos Humanos são mais importantes que todas as tolices clubistas que envolvem o Apostolado natural da esquerda, revolucionária ou não; também entendo que os discursos da direita mais não são do que uma “dor de corno” eterna pelos americanos não terem dobrado aquela pequena aldeia gaulesa do Atlântico, que durante décadas serviu de farol e esperança aos povos da América Latina que lutavam contra o fascismo mais negro das ditaduras militares, tão acarinhadas pelos interesses americanos.
Para mim, Fidel foi um homem que, após a revolução, teve de lidar com a aborrecida tarefa de gerir uma nação. Acho que viveu com inveja de Che Guevara que não estava virado para estas coisas de governo.
Esta tarefa tinha demasiados espinhos: um governo revolucionário à porta do Tio Sam não é coisa fácil de manter por tantos anos, implantar o comunismo num país latino implica abdicar de alguns aspectos da própria ideologia: viver com a Igreja Católica, aceitar um certo ritmo de vida que tem de incluir praia, música e festa, etc.
Viveu sempre entre a espada e a parede, entre a América e a União Soviética, entre o amigo que o financiava e de quem necessitava como ponte avançada da guerra fria, mas que lhe condicionava e obrigava a uma participação física nas lutas em África e a quem nunca seria permitido saltar fora do eixo soviético; por outro lado, a América ressabiada, que perdeu o controle da ilha que lhe dava muito jeito para algumas manobras perversas foi sempre um inimigo (E será para sempre.No dia que a América “entrar “ em Cuba pela via económica, tudo aquilo que significa a revolução e as sinergias criadas em algumas áreas perder-se-á).
Fidel nunca pensou em instituir uma democracia em Cuba: não podia, mesmo que o quisesse. Fez coisas importantes por Cuba ao nível da Saúde e Educação mas tornou difícil a vida do seu povo, desenvolveu a consciência política mas rejeitou outros pontos de vista, respeitou a latinidade mas mandou prender quem se lhe opunha, deu dignidade ao papel da mulher no contexto da revolução, mas isolou os homosexuais e as pessoas com HIV. Não criou Gulags (que isto é um privilégio de grandes potências!) mas teve prisões sem supervisão internacional. Manteve a soberania e autodeterminação mas condenou uma parte do seu povo à emigração forçada muitas vezes em risco, numa travessia marítima que ceifou muitas vidas.
A imperfeição do homem é semelhante a de tantos outros que povoaram este planeta.
Esperemos que o tempo permita um retrato adequado a uma figura importante da história mas que, tal como tantos outros, usou e foi usado pelas circunstâncias históricas.
Nota Final: Ele ainda está vivo, não se esqueçam. A sua influência manter-se-á, independentemente das possíveis alterações!
No entanto, quando a agitação emocional repousar relativamente à sua figura, poder-se-á, enfim, construir uma visão mais racional sobre um homem que configurou uma nação.
Não tenho uma visão romântica de Cuba.
Nunca lá fui de férias, apesar de ser um destino muito apreciado pelos portugueses. Dos que regressaram, ouvi várias histórias que vão desde o idílio apaixonado por um país “romântico”, como um referencial nos idos de 60 até a falta de condições, degradação habitacional, etc.
O povo cubano é retratado simpático mas não servil, educado mas não condicionado.
O único ponto comum aos diferentes relatos que ouvi converge num aspecto: as dificuldades quotidianas e a falta de bens materiais de primeira necessidade.
Conforme as formatações políticas dos meus amigos que visitaram a ilha surgem indícios de corrupção, existindo lojas para o povo e outras para estrangeiros e para as personagens do “aparelho”, as encenações turísticas de rumba até a madrugada, as praias em degradação por uma exploração turística que já vai para além da capacidade de acolhimento e regeneração ecológica.
Outros apregoam que as necessidades e precariedades são fruto do histórico embargo e que a falta de recursos e meios de desenvolvimento da nação passam pelo errado comportamento americano que sufoca o que não domina.
Ouço-os todos e Fidel está no centro, como um farol no que há de pior e melhor.
Longe destas diatribes de santificação/diabolização de um homem convém esclarecer que, apesar das minhas convicções de esquerda, não posso renegar que a Democracia e os Direitos Humanos são mais importantes que todas as tolices clubistas que envolvem o Apostolado natural da esquerda, revolucionária ou não; também entendo que os discursos da direita mais não são do que uma “dor de corno” eterna pelos americanos não terem dobrado aquela pequena aldeia gaulesa do Atlântico, que durante décadas serviu de farol e esperança aos povos da América Latina que lutavam contra o fascismo mais negro das ditaduras militares, tão acarinhadas pelos interesses americanos.
Para mim, Fidel foi um homem que, após a revolução, teve de lidar com a aborrecida tarefa de gerir uma nação. Acho que viveu com inveja de Che Guevara que não estava virado para estas coisas de governo.
Esta tarefa tinha demasiados espinhos: um governo revolucionário à porta do Tio Sam não é coisa fácil de manter por tantos anos, implantar o comunismo num país latino implica abdicar de alguns aspectos da própria ideologia: viver com a Igreja Católica, aceitar um certo ritmo de vida que tem de incluir praia, música e festa, etc.
Viveu sempre entre a espada e a parede, entre a América e a União Soviética, entre o amigo que o financiava e de quem necessitava como ponte avançada da guerra fria, mas que lhe condicionava e obrigava a uma participação física nas lutas em África e a quem nunca seria permitido saltar fora do eixo soviético; por outro lado, a América ressabiada, que perdeu o controle da ilha que lhe dava muito jeito para algumas manobras perversas foi sempre um inimigo (E será para sempre.No dia que a América “entrar “ em Cuba pela via económica, tudo aquilo que significa a revolução e as sinergias criadas em algumas áreas perder-se-á).
Fidel nunca pensou em instituir uma democracia em Cuba: não podia, mesmo que o quisesse. Fez coisas importantes por Cuba ao nível da Saúde e Educação mas tornou difícil a vida do seu povo, desenvolveu a consciência política mas rejeitou outros pontos de vista, respeitou a latinidade mas mandou prender quem se lhe opunha, deu dignidade ao papel da mulher no contexto da revolução, mas isolou os homosexuais e as pessoas com HIV. Não criou Gulags (que isto é um privilégio de grandes potências!) mas teve prisões sem supervisão internacional. Manteve a soberania e autodeterminação mas condenou uma parte do seu povo à emigração forçada muitas vezes em risco, numa travessia marítima que ceifou muitas vidas.
A imperfeição do homem é semelhante a de tantos outros que povoaram este planeta.
Esperemos que o tempo permita um retrato adequado a uma figura importante da história mas que, tal como tantos outros, usou e foi usado pelas circunstâncias históricas.
Nota Final: Ele ainda está vivo, não se esqueçam. A sua influência manter-se-á, independentemente das possíveis alterações!
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