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Brasil: superpotência inteligente do Sec. XXI

Se Deus for de facto brasileiro, espero que encaminhe este país único para um espaço capaz de dar ao seu povo um mundo onde os efeitos da globalização não se transformem em tortura e que possa também dar alguma esperança a um mundo obcecado pelo controle do cidadão, leis de excepção e uma vida cada vez mais triste.
Espero que o calor e a ciência de vida do povo brasileiro que, imerso em problemas gravíssimos, dificuldades várias ao longo dos últimos 40 anos não desarmou. Pelo contrário criou, inventou e “deu a volta por cima”.
Apesar dos desmandos, não consigo esconder a minha simpatia por Lula da Silva e pelo que fez nos seus mandatos (embora não aceite a ideia da sua continuidade por razões óbvias) e de achar que este operário conseguiu encontrar os equilíbrios necessários para, a pouco e pouco, operar uma transformação significativa. Evidentemente, nem tudo estará bem (mas em nenhum lugar do mundo está!) e muito há que fazer.
Todavia, pelo seu potencial, recursos, população e energia, o Brasil poderá ser o exemplo de uma superpotência do futuro e um exemplo mundial de como sem perverter a dignidade e a imagem do povo se consegue erguer um país com voz e acento internacional, modernizar sem prostituir, equilibrar a distribuição sem aburguesar todo um povo, gerar e gerir recursos e disponibilidades.
Evidentemente, todo este texto é escrito com uma lágrima no rosto (não consigo falar do Brasil sem alguma emoção porque se trata…do Brasil).

Sem atrevimentos, gostaria que algumas medidas e políticas fossem implementadas nos próximos anos no sentido de acelerar e exemplificar tudo o que disse anteriormente:

Gestão inteligente dos recursos naturais e controle das industrias extractivas: iniciar o processo de regulação e gestão dos recursos naturais do Brasil significa que a humanidade poderá comemorar outros. Sou relutante em relação ao que o Estado deve controlar, mas os recursos naturais brasileiros deveriam ser um património inalienável, da selva aos rios, da Costa ao interior, do petróleo a banana. Não quero dizer que o Estado deva ter tudo na sua posse, mas deve observar que contratos e com quem os faz, ter um núcleo natural intocável (correspondendo a diferentes ecossistemas que não poderiam ser explorados) e observar cuidadosamente a introdução de novas espécies e experiências “transgénicas”.

Eliminação gradual da corrupção estatal: poderá ainda levar décadas, mas penso que existirão medidas de controlo que possam ser implementadas no sentido de “andar encima” das classes dirigentes. Assim como as análises anti-doping são efectuadas de surpresa, também as contas bancárias dos dirigentes políticos deveriam ser observadas por comissões de cidadãos, também eles objecto de eleição directa. Deveria existir uma agência para-governamental para gerir os negócios das pessoas que ocupam cargos públicos durante o seu período de mandato e cercear a possibilidade de um político poder ser contratado por empresas ganhadoras de concursos públicos (isto se calhar também dava jeito por cá…).

A redução da pobreza e a fixação de populações nos seus Estados: Não sei, sociologicamente, se é importante ou se estou com um preconceito relativamente à mobilidade, mas acho que era vital que existissem condições no Norte e Nordeste brasileiro para que a migração para o Sul não ocorresse da mesma forma que conheci nos anos 70 (e que penso manter-se ainda embora com um impacto diferente). O equilíbrio de oportunidades é fundamental porque já basta o mundo desenvolver-se a várias velocidades, quanto mais um país.

Protecção da selva amazónica e Imposto ecológico mundial: Ponto prévio: a selva amazónica é brasileira e dos países confinantes. No superior interesse do país penso que a sua manutenção, à dimensão de exploração que existia em finais dos anos 60 seria de manter desde que, globalmente fosse considerada a existência de um imposto ecológico devido ao Brasil pela sua manutenção equilibrada, protecção e vigilância. Evidentemente a floresta amazónica é um dos dois pulmões mundiais. Todos beneficiam com a sua manutenção. Não se pode é pedir a um pais em vias de desenvolvimento que durante anos foi vilipendiado em larga escala e que sofreu o embate da pobreza imposta que não possa usar um recurso incluído no seu território. A ideia de manter a floresta como um recurso sustentado pelo mundo não me sai da cabeça porque seria uma forma de salva-la à sua pouco escrupulosa utilização. Supondo que a exploração da floresta equivalerá a 4% do PIB brasileiro (percentagem absolutamente aleatória que só é utilizada a título de exemplo) os países contribuiriam para a sua manutenção intacta por este valor, anualmente, na proporção da sua dimensão poluidora (o rácio por este método também permitiria a alguns países uma maior disciplina ambiental).

Eliminar a ideia de que a Europa e América são exemplos consumados de crescimento: A sociedade de consumo não tem valor. Nem valores. É uma despudorada prostituição humana em que todos capitulam sempre. Mover-se por esta moldura, em que o dinheiro é a cúpula e que o crescimento económico é o único caminho é o maior erro da história. A riqueza humana do Brasil poderá comprovar o contrário se as políticas tiverem sempre presente o valor solidário do povo, removendo a amplitude da distribuição da riqueza. Não se esperam milagres nem mundos perfeitos mas uma caminhada para a sensatez. Qualquer nação pode ser capitalista. Só algumas tentam ser justas.

Manutenção da riqueza social e cultural: O Brasil é diverso, confuso e multiregional. Nas raças, paisagens, cultos e referências. É completo. Destruir essa riqueza será matar um pouco da humanidade e autenticidade de um povo. Em tempos de globalização este talvez seja o maior desafio (maior até que a questão ecológica). Se o Brasil conseguir demonstrar aos outros povos como integrar o que há de diferente e transformá-lo em mais um ponto do bordado (como o faz constantemente com a música) sem perder o sentido do que é visceralmente próprio, o Brasil poderá dar uma das maiores lições à humanidade. Esta riqueza cultural deve manifestar-se na forma como trata os índios e os seus territórios, na manutenção patrimonial e natural, na diversidade religiosa. O Carnaval é o que o povo quiser.

Recordar o seu passado de sofrimento e não negar estender a mão a África sem arrogar os interesses que actualmente povoam estes países: A perspectiva de uma nação solidária no plano interno deve ter um prolongamento internacional, motivando outros países para um percurso idêntico. O Brasil sofreu, de facto, vários dissabores. Os regimes militares e toda a corte de oportunistas que povoaram a política e economia brasileira e que deixaram o país entregue ao caos, a repressão violenta e a soldo de interesses estrangeiros foram o caldo de uma criminalidade violenta que cerca as cidades brasileiras. Tentar uma abordagem diferente junto das nações africanas depende em larga medida dos interlocutores que estes países apresentam. As democracias africanas são incipientes e sujeitas a humores de alguns líderes ou sensibilidades tribais resultantes de uma divisão geopolítica no mínimo arbitrária. Protagonizar um apoio e participação no seu desenvolvimento é apenas possível, em larga medida, por nações sem passado colonial ou imperialista; a China e demais nações orientais vêem África como uma fonte de exploração de riquezas, tal como a Europa tão omissa no apoio mas sempre presente para a exploração de recursos. Resulta portanto que poucas nações poderão ter uma influência tão decisiva em África como o Brasil.

Opção de defesa continental negociada com o eixo Chile, Argentina e Uruguai: A América do Sul constitui-se como um eixo de recursos mundiais, como tal, está sujeito a variadas ambições que a meio deste século poderão mesmo constituir um factor de cobiça em larga escala. Presumindo que a estabilização democrática de uma parte da região é irreversível e que, esperamos, no futuro, outras nações vizinhas se possam juntar, o planeamento da defesa continental deveria ser pensado sem a exclusão de nenhum dos países.

Evidentemente nesta fase seria importante que se desenvolvesse ao nível das nações mais estáveis, como o Chile, a Argentina e o Uruguai e, a pouco e pouco integrando as restantes nações à medida da sua estabilidade. Não existindo problemas fronteiriços decisivos, nada obsta na existência de um plano de defesa comum que permitiria várias potencialidades:
Dispersão do poder militar de cada nação, diminuindo eventuais ambições dos caudilhos que ainda povoam as forças armadas de alguns países,
Defesa comum de interesses regionais;
Maior capacidade de mobilização e resistência a potenciais ingerentes;
Redução global do número de efectivos militares (menos despesas de cada Estado) e apetrechamento adequado aos potenciais perigos e desafios contemporâneos.
Esta solução permitiria uma maior coesão continental e retrairia algumas tentações que suponho irão acontecer num futuro não muito distante.


Desenvolvimento da industria aeroespacial: Penso que será uma aposta fundamental para o Brasil, sobretudo se esta envolver a participação de outros países do hemisfério Sul (África do Sul, por exemplo). Não se trata de uma vaidade tecnológica ou concorrência com as potências desta área. É sobretudo criar, através de uma área de grande desenvolvimento tecnológico um espaço para as universidades, as indústrias pesadas que necessitam de conversão e para o crescimento de uma mão-de-obra especializada. Trata-se pois de criar um nicho de interesse nacional que leve por arrasto outras empresas e reforce o papel dos saberes. E porque esta? Para já o Brasil tem experiência na área; depois, outras empresas de grande valor tecnológico estão “na posse” de grandes grupos económicos (farmacêutica, informática, etc). Esta “especialização” aeroespacial pode potenciar outros destinos económicos e gerar qualificações, fortalecendo o tecido humano brasileiro.

Nunca esquecer Portugal, no melhor e no pior: Longe de perorar à volta dos países irmãos, história, etc. interessa valorizar o fenómeno voz. Esta língua que dispersa pelo mundo pode ser cada vez mais falada e sobretudo ouvida (que é o que verdadeiramente importa). Andamos à 500 anos de cá para lá e vice-versa, trocando palavras, borrando a gramática e refazendo a língua em perpétua viagem. Deve ser assim por muitos e longos anos e sempre. O que me apetecia era que não fossem necessários passaportes para ir para um lado ou outro. E que se as coisas correrem mal, cá ou lá, possamos continuar a encontrar-nos no Oceano e completando os sons que fazem as nossas palavras.

Comentários

Anônimo disse…
Gostei do seu texto! Abraços!

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