Pular para o conteúdo principal

A edificação do vazio: como um politico não fazendo obra, faz figura

Cuido que Goebels não terá sido um actor equilibrado. Outra figura mais sensata e não wagneriana possivelmente tê-los-ia levado a uma vitória surpreendente.
As lições da história são importantes por isso mesmo: (re) conhecer os erros do passado para repeti-los conscientemente.

Artista frustrado e recusado pelas Belas-artes de Viena, Goebels desenvolveu aquilo que hoje é reconhecido como as bases da propaganda/publicidade, formulando os postulados essenciais desta actividade.

A obra de Goebels é etérea mas perdura no tempo quer pelo impacto lúdico e ritual (como já o faziam nos comícios nazis, transformados agora em gigantescos “happenings” de lazer), quer pela acção política que consiste numa gestão de imagem, colocando a tónica no afectivo (ninguém pode ser indiferente).
A informação/desinformação, o conflito, a difamação e a dissolução das franjas minoritárias de contestação/oposição são usadas da mesma forma em que, no caso extremo do Nazismo, arrastou judeus, ciganos e outros pólos de diferenciação para os fornos, responsabilizados pelos males do mundo, a pobreza, o atavismo, a miséria moral, etc.

A política aproveitou essa ciência talvez de uma forma tão intensa quanto os detergentes e as companhias de seguros. Cientes de que a estratégia é correcta, aplicam-se os seus princípios na gestão corrente para perpetuar e legitimar as acções políticas, permitindo o objectivo último de gerir e fazer crer que algo é feito quando, de facto, não se cria coisa nenhuma, isto é, nada de significativo e de benefício público.

Não sendo Portugal uma excepção, a gestão da imagem pública, dos factos criados, das consequências das decisões, o arranjo manipulativo e o controle social dos factos são exercidos com a proficiência necessária.

Analisaremos cada um dos princípios de Goebels à luz da política nacional. Dada a extensão do tema, optamos por distribui-lo em várias publicações para não se tornar tão chato.

1. O propagandista deve ter acesso às informações relevantes sobre os acontecimentos e a opinião pública.

A máquina de propaganda deve ser montada de forma piramidal, desde os pequenos líderes locais até à estrutura de produção de material e sua coordenação. Qualquer político que queira sobreviver hoje em dia sabe isso e coloca as suas “pedras” nas associações, fundações, sindicatos, televisões como pivots de veiculação.

2. A propaganda deve ser planeada e executada por um único órgão.
Ele deve emitir todas as directrizes de propaganda.
Ele deve explicar estas directrizes aos funcionários em cargo de confiança e manter a moral alta entre eles.
Ele deve supervisionar as actividades de outras agências que tenham efeito propagandístico.

A centralização na pessoa facilita a montagem das estratégias, colocando as pedras de confiança ora em suspenso, ora no activo, conforme os objectivos imediatos. Isto leva a que só ele possa desenvolver um discurso integral e predominante, sendo os outros meros artifícios parcelares que são usados (e deitados ao fogo, se necessário).
Esta estratégia permite dois efeitos: sobressai o líder como único “capaz” de conduzir a política em causa e cria uma guerra velada entre os acólitos que, na disputa por um lugar mais elevado na hierarquia; realizam para além do exigido, cultivam a delação e o controle dos seus pares, fornecendo ao líder um tabuleiro de peças programáveis em função das necessidades emergentes.


3. As consequências propagandísticas de uma acção devem ser consideradas ao planeá-la.

A acção política dos nossos pequenos Goebels tende a funcionar por oposição imediata à política anterior, ou seja, privilegiar uma imagem antípoda.
Se o anterior responsável tinha imagem de gastador, a mensagem será o rigor (mesmo que até gastem mais); se foram as preocupações sociais do outro executivo este vingará pelo projecto económico, etc.
Esta acção procura retirar um efeito reforçador junto da opinião pública nas áreas em que o anterior magistério foi mais criticado. Tal acção, devidamente acompanhada de promoção propagandística geralmente garante dois anos de “paz pública” e abordagens suaves da Comunicação Social.

(continua…)

Comentários

Helena Henriques disse…
Levam de tal maneira isto à letra que, no mesmo dia em que acabam com o Estado providência para ser liberais, reforçam-no para captar simpatias dos populares à porta das urgências fechadas - não se atrevendo a repetir aqui, que os privados é que prestavam o serviço bem (pudera, privados sem fees não funcionam, acaba o fee e acaba o tratamento). Esta coisa de agradar a gregos e troianos não há-de ser fácil! Ah, na base da pirâmide também há a figura interessante do ... cão de fila? E pelo meio haverá certamente o bufo. Tudo gente adorável com posturas detestáveis :)

Postagens mais visitadas deste blog

Dos governos minoritários e maiorias absolutistas

Na óptica dos partidos mais votados em Portugal, a governação em situação minoritária ou de coligação é inviável. A ideia de um pequeno partido poder influenciar, propor e monitorar o comportamento aberrante dos partidos centrais é uma situação intolerável para estas máquinas de colocação de militantes e de controlo de investimentos privados. Acenam com o caos, a ingovernabilidade e o piorar da situação do país. Esquecem que o país caminhou para o fundo do abismo pela mão de ambos. Não por uma inépcia ou incapacidade das suas figuras, mas por dependência de quem os financia, de quem os povoa e da impossível subversão ao sistema corporativo vigente. Sócrates afrontou algumas destas entidades instaladas e vive a antropofagia quotidiana dos jornais e televisões e – vejam lá – ele não é um perigoso extremista, até porque o seu partido chutou soberanamente João Cravinho para canto, mais os seus amoques contra a corrupção. Se a memória não me falha Ferreira Leite foi a Ministra que teve a pe

Balanço e Contas: 2 anos de governação

Ao fim de 2 exaustivos anos de governação importa fazer uma reflexão não sobre os atos do governo mas sim sobre o comportamento da sociedade em geral relativamente ao que se está a passar. Para faze-lo, importa ter presente algumas premissas que a comunicação social e as pessoas em geral insistem em negligenciar e a fingir ignorantemente que não são as traves mestras do comportamento governativo: 1. Este governo não governa para os portugueses nem para os seus eleitores; 2. Este governo não pretende implementar qualquer modelo económico. Pretende apenas criar a rutura necessária à implantação de um; 3. A sua intervenção orienta-se por uma falsa perceção de que a sociedade portuguesa entrou em rutura com o socialismo e as conquistas sociais do 25 de Abril; 4. Para agradar credores e cair no goto do sistema financeiro que irá propiciar empregos futuros a quem for mais bandalho com o seu país, usou o medo para tornar a mudança incontornável, culpando e responsabilizan